domingo, 30 de outubro de 2005

[des]entendimentos…

este contributo calçado nos sapatos vermelhos, serve de forma extraordinária para esta pequena caminhada do passeio da complementaridade a este sr. certinho vs. caseiro

«
nem sempre as pessoas dizem o que pensam.
nem sempre as pessoas dizem o que querem dizer.
nem sempre as pessoas usam as palavras certas.
nem sempre as palavras correspondem à verdade.
nem sempre as pessoas ouvem o que o outro disse.
nem sempre as pessoas entendem o que foi dito.
nem sempre as pessoas sabem o que o outro quis dizer.
nem sempre as palavras são aquilo que se queria que fosse.

nem sempre há palavras.
haverá sempre pessoas sem saber o que dizer.
haverá sempre pessoas que não entendem o que foi dito.
»

o positivo do negativo

ele há momentos que do ponto de vista pessoal da qualidade vivencial e societal são pouco expressivos. ele há momentos que são verdadeiros assomos de (re)descoberta

ele há momentos em que estando apenas num sítio e numa determinada conjuntura física e social, se está simultaneamente em sítios variados ancorados no éter (*)

ele há momentos que nos dizem tão pouco e simultaneamente são reveladores de tanto, revelando-se afinal em experiências absolutamente enriquecedoras, quando pareciam condenadas a um deserto absoluto

ele há sempre coisas para descobrir, angariar, trabalhar, maturar…
sobre mim, sobre os outros, sobre o mundo, sobre…

(*)
éter é uma palavra de origem grega: aithér, que significava, primitivamente, uma espécie de fluido subtil e rarefeito que preenchia todo o espaço e envolvia toda a terra (ubiquidade: o estar em toda a parte a todo o tempo). os gregos, fazendo uso da linguagem, compuseram o termo, provavelmente, a partir de aeí / sempre, e de theîn / correr; aquilo que sempre corre, o que está em perpétuo movimento

quarta-feira, 12 de outubro de 2005

7 notas a partir de 2 dedos de conversa

- i love music, i breathe music
- para mim é um caso de bidireccionalidade
- temos filósofo…


bidireccionalidade refere-se à caracterização de uma relação que é estabelecida em que a transferência ocorre simultaneamente nos dois sentidos entre dois elementos


usar a palavra bidireccionalidade garante ‘instantaneamente’ ao seu utilizador uma aura algo invulgar, merecendo o epíteto de ‘filósofo’ (mas atenção não descontextualizar nem sobrevalorizar seriamente o que foi dito de forma descontraída), isto é, bidireccionalidade não será uma palavra frequente, quem a usa sairá do comum. sobre este assunto, estudos recentes demonstram que o conjunto de palavras mais usadas no quotidiano é cada vez menor, ou dito de outra forma, cada vez um maior número de pessoas se exprime através de um menor número de palavras, isto é, o seu léxico é cada vez menor, e a sua consequente riqueza de expressão e diferenciação

mi
em jeito de exemplo colateral à nota anterior, e à guisa de curiosidade, deixo aqui dados relativos ao caso chinês, em que nos dicionários advindos das últimas dinastias foram ‘recenseados’ 9353 caracteres. pensa-se que um indivíduo formado provavelmente poderá reconhecer mais de 6000 caracteres. em 1952 definiu-se um patamar de literacia para os camponeses fixado no reconhecimento de 1500 caracteres, e de 2000 caracteres no caso de operários. no entanto, é referido que para ‘ler’ um jornal é necessário reconhecer cerca de 3000 caracteres


filósofo é entendido como alguém invulgar, um tipo ‘afastado da realidade’ que pensa umas coisas malucas que mais ninguém quer saber e não interessa ao comum dos mortais. etimologicamente, filosofia significa amor pela sabedoria, pois que filósofo será aquele que ama a sabedoria… no século xviii era sinónimo de livre pensador. entretanto e sem grandes parangonas, segundo um qualquer simples dicionário, filósofo é aquele que se aplica ao estudo dos princípios e causas e à reflexão racional consistente acerca de princípios gerais que tem o objectivo de obter um entendimento mais profundo das coisas

sol
sim, de facto estabeleço com a música uma relação bidireccional, na medida em que faço opções musicais em função do meu estado de espírito, e em que me deixo influenciar pela música alterando o meu estado de espírito a partir das sensações que uma determinada música me pode provocar. mas não é só nesta medida de simplicidade ou de reciprocidade eu-música. a mesma música pode em si encerrar e provocar diferentes excitações, exaltações, e/ou acalmia, serenidade, ‘degustação’, seja na própria música em si, seja a mesma música em momentos diferentes. por outro lado uma mesma música aparentemente activa pode resultar numa percepção mais passiva e viceversa


mas há a música pela melodia, pela voz, pela letra, pelo conjunto, pela sonoridade, pelo ritmo, pelo interprete, pelo momento, pelo significado em si ou atribuído, pelas remissões a outros, a acontecimentos, a momentos, a vivências, pela transmissão e comunicação de ideias, de sensações, de sentimentos, pela força catalizadora e geradora de pensamentos, pelo contributo para a intra, auto e inter expressão, e pela própria miríade de razões intangíveis e não passíveis de serem elencadas à exaustão

si
em sentido figurado, sendo o intérprete da minha própria personagem no filme da minha vida, em rodagem a todo o instante, é necessidade imperiosa a existência, a todo o instante, da envolvência musical constituindo a todo o momento a respectiva banda sonora

sábado, 13 de agosto de 2005

fala à vontade

passei por lá, e não me limitei a atravessar de ponta a ponta, percorri os ínvios caminhos pelo interior desse enorme campo de letras que foi sendo semeado, cultivado e tratado ao longo do fio dos dias, colhendo excelentes 'frutos' de palavras que realmente são mais do que pão para a boca, são pão para a alma, e que no entando não sacia essa fome de sentimentos, pelo contrário, anseia-se por mais e mais... bem haja

segunda-feira, 1 de agosto de 2005

sr. certinho vs caseiro

sr. certinho foi como alguém se dirigiu para mim.

não pude deixar de entender este epíteto completamente deslocado, ainda vindo de quem veio.

compreendo-o, de algum modo, mas concedendo-lhe uma margem de veracidade muito exígua, passe a redundância (1).

por outro lado, é o exemplo acabado de que se chega a rótulos imediatistas tão imprecisos quanto ridículos, e leva-me um pouco mais longe, pressupondo uma analogia global e genérica:

o mundo é o palco da vida em que todos somos actores, ora principais, secundários, ou meramente figurantes, dependendo das situações, no tempo e no espaço, e ainda numa outra dimensão que se refere ao social, entendendo esta última dimensão no que respeita aos destinatários das acções sejam no papel de intervenientes na cena ou de meros espectadores.

em todo o caso, um mesmo indivíduo pode assumir todos os valores possíveis numa gradação de valorização da importância da sua representação, dependendo do ponto de observação, ou se se quiser chamar, numa figura cartesiana, dependendo do ponto de origem.

mas mais do que isto, estamos presentes numa grande peça, mas desempenhando diferentes papéis, ou melhor dito, num sistema de peças, entrando em várias sub-peças que constituem as suas diferentes partes.

deste modo, cada indivíduo tem do outro, não a sua exacta correspondência enquanto indivíduo mas sim uma representação, um papel, uma parte do sistema, que pode ser mais ou menos superficial, ou mais ou menos próxima do sistema no seu todo (sendo que o sistema no seu todo não existirá, ou talvez melhor dito, tenderá para o infinito).

e aqui neste jogo de representações há de tudo, desde representações naturais, a representações dissimuladas, a representações forçadas, a representações voluntárias e involuntárias, e a cada instante os indivíduos poderão de alguma forma regular o seu grau ou a sua postura de actuar, fornecendo representações minimalistas, através de pequenas partes do sistema, ou através de representações mais consentâneas com o aproximar do todo.

é não perceber a relatividade da representação da vida real, e o papel de cada um tem, para consigo próprio e em relação aos outros actores, que casos caricatos como este surgem.

infelizmente ou felizmente, vá-se lá saber…

(1) [para o melhor entendimento da origem desta compreensão e do seu grau de valorização seria necessário um desbravar por assuntos que no caso não se inserem no âmbito do que aqui vai aparecendo, inclusive, este próprio ‘post’ já poderá parecer excessivo…]

quinta-feira, 16 de junho de 2005

estou farto...

estou farto de ouvir e
farto que me digam
que sou um tipo inteligente,
espectacular,
que consegue ver para além de…

que vê,
que escreve,
que ouve,
que se interessa por isto,
que se interessa por aquilo,
que é um verdadeiro profissional naquilo que faz,
e que ‘domina’ um conjunto de pequenas ferramentas paralelas e úteis…

que tenho capacidade disto e daquilo,
que produzo elementos e trabalhos com valor,
que sou ‘amigo’,
que sou simpático,
que sou boa companhia,
etc.

todo um conjunto de coisas
que me surgem como visões
positivas e favoráveis e elogiosas
da minha pessoa.

estou farto!
parem por favor!
rogo-vos para que parem com essas considerações!

até porque não sou nada disso que dizem que sou.
não me sinto assim.
não sou!

e mesmo que assim o fosse ou seja,
a verdade é que não me tem levado a lado nenhum.
não sou mais feliz por isso!

não sou assim!
ou
não quero ser assim:
que sou diferente!
que sou uma pessoa bastante especial!
etc.

parem!
não sou!
não quero ser!
não quero ser diferente!
não quero ser especial!

quero ser normal!
só quero ser normal!
quero ser feliz!
só quero ser feliz!
seja lá o que isso for!

não quero ser especial!
não quero que me digam que sou especial!
para depois logo a seguir
me dizerem que não querem estar comigo,
que não gostam de mim!
para depois me abandonarem!
não quero que me admirem!

quero simplesmente que gostem de mim!
quero somente gostar de alguém!
quero estar com alguém que queira estar comigo!
quero afinal o que toda a gente quer:
quero amar e ser amado…

segunda-feira, 25 de abril de 2005

o ‘teu’ corpo

ora ele há coisas que realmente são uma grande coincidência…

andava eu há um determinado tempo a pensar em escrever sobre uma determinada sugestão mental que um certo artigo de publicidade me suscitava, e estava cada vez mais decidido a transpor para a escrita essas questões, até que hoje dou por mim a ler o artigo da isabel stillwell, na notícias magazine de hoje, 24 de Abril de 2005, que por vias travessas e próximas me forçam claramente a não deixar de escrever sobre o assunto.

no dito artigo, intitulado ‘dura comparação com as moças dos anúncios’, isabel stillwell tem um assombro de realidade e toma consciência de que ‘não vamos para mais novos, nem para mais magros’, afirmando-o neste contexto de aproximação do verão, em que em tudo quanto é lado, somos invadidos pelas campanhas publicitárias que apelam à preparação do corpo para os ditames da exibição da forma do corpo, e a procura de atingir esses ‘modelos de virtude’ que surgem em tudo quanto é anúncio de televisão, de jornais, revistas, mupis, outdoors, etc.

essas coisas que ‘de todos os lados nos cercam e nos parecem impor a urgência de sermos aquilo que não somos, de parecermos aquilo que não parecemos, de usarmos uma roupa de geometria impossível sobre um corpo que temos a obrigação de conservar imune à passagem do tempo’…

e agora, perguntar-me-iam (como se eu estivesse diante de uma plateia ou audiência, ou à conversa com alguém), mas como é que isto se relaciona com aquilo que andavas para aí a matutar?

e eu explico:

defronte do meu local de trabalho existe uma farmácia, que até há bem pouco tempo ostentava na sua montra um enorme placard publicitário a um desses produtos cosméticos, adelgaçante, reafirmante, anti-celulite, e o mais que eu sei lá. mas o que tinha esse placard de interessante? ora tinha precisamente como ‘cabeça de cartaz’ uma dessas ‘moças novas’ de que fala a isabel stillwell, fotografada de costas, e realçando o seu corpo desde a parte inferior das costas às coxas, demonstrando as suas formas firmes e mostrando tudo no sítio, ou muito próximo daquilo que serão as ‘medidas anatómicas ideais do modelo da beleza contemporânea’.

mas o que tinha de tão sugestivo?

o que tinha de tão sugestivo, era realmente a sua extrema capacidade de atrair a minha atenção para ele, mas por vias indirectas. eu explico melhor. sempre que por ali passava, não conseguia deixar de o observar durante alguns segundos, mas o que eu via não era propriamente o dito cartaz, nem captava ao ínfimo pormenor as formas da dita ‘moça’. a minha mente buscava a imagem de uma figura feminina, outra, seja ela qual for, ou seja, olhando para o cartaz eu não via a modelo, mas antes visualizava um corpo inexistente, outro qualquer

não interessava, e não interessa, aquilo que são os ditames impostos pelo actual contexto social da forma modelo. o que quero dizer é que tinha ali defronte dos meus olhos uma sugestão próxima do modelo, mas que isso não me despertava nada de importante, nem de menos importante. digo mesmo que era nulo o interesse. na verdade, o especial dessa sugestão era mesmo a visualização de um corpo imaginário, com as suas formas próprias, com as suas especificidades, ora mais próximas, ora mais distantes desses modelos, ainda que sem definição de formas e proporções

o que importa mesmo, era realçar num corpo, cada ínfimo pormenor, cada curva, cada poro, cada sinal, cada borbulha, as tonalidades da pele, ora mais rosado aqui, ora menos ali, a sua temperatura, com as suas partes frias e as suas partes quentes, era essa cartografia mental que me assaltava, e que no fundo era associar todos esses pormenores à existência (ir)real de um corpo, e não o de um corpo que pode pertencer a qualquer pessoa indistintamente. ou seja, todos aqueles pormenores, que sejam passíveis de cartografar na mente, com todos os sentidos, de um corpo com determinadas formas, e que pertencem a um corpo particular e único que é ‘aquela’ pessoa, de quem se pode sentir a sua ausência, e a ausência do seu corpo.

numa perspectiva de não se sentir a ausência de uma qualquer companheira, de um qualquer corpo. sentir a ausência ‘daquela’ companheira, e ‘daquele’ corpo. que por sinal, muita boa gente não vive muito bem dentro dele, mas que é um corpo que se admira e que se adora percorrer cada ínfimo pormenor dele.

não me interessam nada esses ‘modelos de virtudes’, o que me interessa é ‘um’ corpo, com os seus ‘defeitos’ e ‘imperfeições’, mas que são precisamente esses defeitos e imperfeições que lhe dão a sua personalidade, e são esses defeitos e imperfeições que não se encontram em mais nenhum, porque é único. e são esses pormenores únicos que me fazem ‘amar’ ‘um’ corpo e quem mora nele…

quarta-feira, 16 de março de 2005

Estrangeirismo

further down the spiral
of mellon collie and
the infinite sadness